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26/10/2015 imprensa Comentários desativados em O pedágio e a demagogia

O pedágio e a demagogia

“Não fosse isso e era menos.
Não fosse tanto e era quase”
Paulo Leminski

Durante anos eu acreditei que a única solução em relação ao desastrado modelo de pedagiamento das rodovias paranaenses era a do enfrentamento e anulação dos contratos. Pela minha opinião, quando Roberto Requião assumiu o governo em 2003, ele deveria ter decretado no primeiro dia, na primeira manhã de trabalho no Palácio Iguaçu, a nulidade dos contratos com as concessionárias de pedágio. Tinha legitimidade para isso, até porque havíamos feito a campanha com o meta-discurso: ‘pedágio, baixa ou acaba’.

Como todos sabem não foi o que aconteceu. Ao contrário, o governo resolveu adotar a estratégia de judicializar a questão e o resultado: foram oito anos de derrotas na justiça, obras suspensas e o pedágio mais que dobrou de preço.

Há 18 anos, desde que o modelo perverso de concessão de rodovias foi implantado no Paraná, luto para abrir a caixa preta do pedágio. Desde sempre, insisto em trazer mais luz sobre os contratos.

O tempo mostrou que eu tinha razão quando dizia que o “Anel de Integração” imaginado pelo governador Jaime Lerner não passava de uma ficção – e que traria mais malefícios do que benefícios à economia paranaense.

A licitação do pedágio foi fruto de um conluio havido entre o governo de então e as empreiteiras participantes, e prova disso é que depois foi revisto. As tarifas foram reduzidas em 50% em 1998 para que Jaime Lerner pudesse ser reeleito. Reeleição garantida, as tarifas foram reajustadas suprimindo obras essenciais ou postergando-as para o final do contrato e ainda se criou os “degraus” tarifários que aumentaram ainda mais a tarifa.

As investigações feitas pelo Ministério Público Federal e pelo Tribunal de Contas da União mostraram que os aditivos nos contratos de concessão de rodovias foram feitos de forma unilateral e beneficiaram apenas as concessionárias.

Uma de minhas frustrações como líder do governo Requião na Assembleia Legislativa foi não ter conseguido convencer o DER a implantar um “pedagiômetro” para que pudéssemos saber, não pelas informações prestadas pela ABCR (associação das pedageiras), mas por um banco de dados público, por meio de um sistema eletrônico que pudesse monitorar o volume e a evolução do tráfego nas praças de pedágio.

É o que prevê o projeto de lei 754/15, que apresentei na semana que passou na Assembleia Legislativa, com a coautoria de mais 26 deputados e que tramitará em regime de urgência.

Com o monitoramento, teremos um instrumento eficaz para analisar o número de veículos que passam diariamente pelas praças de pedágio e saberemos o faturamento real das concessionárias. Estamos trazendo mais transparência ao sistema.

Um estudo da Ocepar (federação das cooperativas do Paraná) revela que o preço médio praticado no país, para automóveis, a cada 100 km percorridos, é de R$ 3,41, enquanto no Paraná chega a R$ 11,05 para cada 100 km.

O mesmo estudo mostra que a tarifa de pedágio no Paraná é mais do que o dobro do valor cobrado nas concessões da Rodovia Presidente Dutra, em São Paulo, de R$ 4,58/ 100 km.

Juntas, as seis concessionárias de pedágio que atuam no Estado admitem ter tido um lucro líquido de R$ 437 milhões em 2014.

Por outro lado, foi por meio do diálogo, que o atual governo fez andar várias obras que pelo contrato original já deveriam estar prontas há uma década e que são agora retomadas.

Já foram concluídas as duplicações na BR-277 entre Guarapuava e Relógio, Medianeira e Matelândia e o contorno de Campo Largo, e na PR-445 na cidade de Cambé. Estão em andamento as duplicações da rodovia do Café, a BR-376, entre Mandaguaçu e Nova Esperança e entre Apucarana e Jandaia do Sul; na PR-317, entre Floresta e Campo mourão; na BR-277, entre Matelândia e Ramilândia; e na PR-407, entre Paranaguá a Praia de Leste.

Recentemente, o governador Beto Richa anunciou a antecipação para 2016 das obras da duplicação de 32 quilômetros da BR-369, entre Jataizinho e Cornélio Procópio. Obra prevista apenas para 2021, um ano antes do término da concessão.

As obras estão saindo do papel, mas é inegável que as alterações e aditivos contratuais feitos desde a implantação do pedágio causaram grandes aumentos de custos à sociedade paranaense e ao setor produtivo. Durante anos pagamos um pedágio exorbitante sem a contrapartida das obras.

Também considero questionável a proposta que vem sendo discutida da prorrogação dos contratos de concessão de rodovias que vencem em 2022. Não acredito que renovar contratos que nasceram com vício de origem seja a solução para o pedágio no Paraná.

São contratos anacrônicos onde prevaleceu a concessão onerosa e a tarifa mais alta, que praticam uma taxa interna de retorno para as concessionárias superior a 20%, quando hoje em outras regiões do país a taxa varia entre 6% e 8%.

Considero que o sistema de monitoramento eletrônico a ser implantado nas praças de pedágio pelo DER, vai nos permitir estabelecer novos parâmetros para futuros contratos, e também para ver o quanto a mais do previsto inicialmente, as concessionárias estão faturando e com isso ter um novo mecanismo de negociação que poderá subsidiar a atuação da reestruturada Agepar (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Infraestrutura do Paraná), no processo de fiscalização e homologação de reajustes tarifários contratuais.

As licitações de concessões de rodovias feitas pelo governo federal – vence quem oferece a menor tarifa – comprovam que é possível pagar um pedágio mais barato e com a garantia da realização das obras previstas. Que os erros do passado sirvam não para repetir, mas para refletir.

*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PMDB e líder do governo na Assembleia Legislativa do Paraná.

19/10/2015 imprensa Comentários desativados em A banalização do mal

A banalização do mal

“Quando querem transformar dignidade em doença

Qando querem transformar inteligência em traiçã

Quando querem transformar estupidez em recompensa

Quando querem transformar esperança em maldição:

É o bem contra o mal

E você de que lado está?” – Renato Russo.

Que a fala inicial seja em homenagem aos companheiros da luta, injustiçados pela prisão ou pelo exílio. Todo tributo de apreço aos homens e mulheres da resistência democrática que foram punidos pelo arbítrio, mas consagrados pela gratidão e pelo respeito nacional. Nossa solidariedade mais fraterna aos órfãos de pais vivos, quem sabe? Mortos, talvez… Órfãos do talvez. Órfãos do talvez e do quem sabe. As viúvas com maridos vivos, quem sabe? Mortos, talvez viúvas do quem sabe e do talvez.

Essas palavras acima não são minhas. São do deputado federal Alencar Furtado, proferidas no programa eleitoral do MDB nos idos de junho de 1977, e que lhe custaram a cassação do mandato, com base no famigerado AI5, ditado pelo general Ernesto Geisel.

Trata, por óbvio, do flagelo que o país então vivia por conta dos mortos e desaparecidos da ditadura militar. Oposicionistas eram presos por órgãos da repressão do Estado, torturados, mortos e sumidos como se nunca tivessem existido.

Foi uma quadra infeliz da história, marcada pelo fim das liberdades individuais, pela censura, pela proibição das manifestações, extinção de partidos políticos, intervenção no poder judiciário.

Na ditadura nasceu o crime organizado, cresceu a promiscuidade entre a polícia e os marginais. A ditadura promoveu e depois anistiou torturadores, como o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, morto na semana passada, sem ser punido pelos crimes que cometeu. Ustra comandou entre 1970 e 1974, o Destacamento de Operações de Informações do II Exército, em São Paulo, que foi o principal centro de tortura, desaparecimento e morte de oposicionistas durante a ditadura. Assim como outros torturadores, Ustra alegou que apenas cumpria ordens.

Além de todas as atrocidades que ainda marca a vida do país, de forma indelével, a ditadura ceifou o surgimento de toda uma geração de novas lideranças que poderiam, de forma significativa, contribuir em todos os campos de atuação na construção de uma nação soberana. Retraiu-se o país por 20 poucos anos e muitos lutaram para a retomada do estado democrático de direito.

Foi uma luta árdua, difícil e hoje fico perplexo quando vejo por aí gente defendendo a volta do regime militar – que deixou um legado já pontuado nas palavras acima. Como também fico atônito ao verificar o resultado de pesquisa do Datafolha, que mostra que 54% dos moradores do Sul do país acreditam que “bandido bom é bandido morto”.

Sem dúvida, a sociedade está anestesiada pela violência, a tal ponto que está perdendo a capacidade de se chocar com a onda de crimes contra a vida. A violência virou algo trivial, corriqueiro, banal. Vive-se, sim, a banalização do mal, conceito criado pela filósofa alemã, naturalizada americana, Hannah Arendt.

Em 1961, Hannah acompanhou o julgamento do nazista Adolf Eichmann em Israel, acusado de genocídio e crimes contra a humanidade durante a segunda guerra mundial. Dois anos depois do julgamento, a filósofa lançou um livro baseado em suas observações – “Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal”.

Hannah Arendt concluiu que Eichmann – que durante o julgamento ficou confinado numa cabine de vidro – não era um monstro, sádico ou demoníaco. Era um homem normal, um burocrata que cumpria ordens sem quaisquer questionamentos. Organizar o transporte de milhares de judeus para os campos de concentração era apenas uma questão de logística e ele cumpria as ordens de superiores sem pensar. Para ela, isto só podia ser compreendido pela banalização do mal que se instala no vácuo do pensamento, trivializando a violência. O homem na cabine de vidro era um homem comum, tão comum quanto a muitos outros. Era um funcionário cordato, servil e obediente e também um assassino eficiente.

Em paralelo ao que Hannah Arendt escreveu 1961, pode-se concluir que hoje, em pleno século XXI, 70 anos depois do fim da segunda guerra, volta-se a viver em tempos sombrios. Se na Alemanha nazista a omissão da sociedade permitiu a ascensão nazista e o holocausto, por aqui e em outros de países de todos os continentes, a criminalidade já não surpreende, mas revolta.

A tal ponto que há os ruidosos e furiosos defensores da volta do regime de exceção, os que aplaudem torturadores, os que apoiam o “bandido bom é bandido morto”. E o fazem descaradamente, sem qualquer pudor ou trava social. São homens comuns e não estão em redomas de vidro. Nesses tempos bicudos, delator vira ídolo, justiceiro vira herói e todos são culpados, até que prova em contrário. Consagra-se a intolerância. Trivializa-se a violência. Há um vácuo de pensamento. E há o silêncio dos bons. E é neste caldo de paranoia social que cresce e prospera a semente do totalitarismo.

*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PMDB e líder do governo na Assembleia Legislativa do Paraná.

12/10/2015 imprensa Comentários desativados em O vento, e o quem vem por aí

O vento, e o quem vem por aí

“Dizem que a vida é para quem sabe viver, mas ninguém nasce pronto.
A vida é para quem é corajoso o suficiente para se arriscar
e humilde o bastante para aprender”
Clarice Lispector

Quando na semana passada, ao falar de um dos maiores desafios para o crescimento do pais, a geração sustentável de energia, a presidente Dilma pontuou especificamente uma área de estudos que tem sido objeto das pesquisas dos cientistas que atuam com a geração de energia eólica, a “estocagem” da energia produzida pelo vento. Ato contínuo uma onda de memes invadiu a internet para ridicularizar a fala presidencial.

Minha mulher, Fabiana Campos, que é química e doutora em Ciências pela UFSCar, me explicou que sim, é possivel e necessário “estocar” o vento – ou seja, todo o excedente gerado pela produção de energia eólica pode ser convertido por meio de um sistema, relativamente simples, de eletrólise – onde, a partir da passagem da energia pela água, os átomos de hidrogênio são separados dos de oxigênio, e assim, pode ser armazenado o hidrogênio como combustível para atender ao consumo de energia nos dias sem vento.

Ela acredita que a geração de energia a partir da produção de hidrogênio é a fonte inesgotável de energia sustentável do futuro, independente de como o mesmo é produzido.

Quem atua na área sabe, que a energia eólica tem recebido grandes investimentos para que seja rompido o maior entrave de uso comercial – o armazenamento.

Estocar o vento é importante, mas ninguém quer saber disso, na era da intolerância, “pau” na Dilma, mas vamos ao que me propuz nessa semana – falar sobre o que vem por aí.

Passados os primeiros nove meses desta legislatura, chegamos a um momento muito diferenciado em relação à situação vivida por outros legislativos convocados a encontrar soluções e alternativas frente à grave situação econômica que afeta os estados e municípios brasileiros.

Não por menos: o Paraná se antecipou com medidas amargas e até impopulares e vê agora, com graus similares, decisões que se aprovadas ainda neste mês de outubro só devem impactar nas receitas dos estados a partir de 2016. Estados, diga-se, que ainda terão uma margem muito mínima para investimentos. É o cenário que se apresenta para os próximos dois anos e o Paraná, acredito, será uma boa exceção.

O bom exemplo estará nas mãos dos deputados para discussão nas próximas semanas. O orçamento previsto em R$ 54,5 bilhões de receitas e despesas para 2016, também projeta R$ 6,8 bilhões – metade disso será de recursos próprios, do caixa do Tesouro Estadual, o restante será das estatais – de investimentos em obras de infraestrutura e outras ações nos municípios paranaenses. Detalharei mais abaixo os números do orçamento, mas trocando em miúdos, as prefeituras terão no Estado um forte apoio neste momento bicudo da economia. Investimento em obras, em especial na construção civil, como já disse anteriormente, é a medida mais rápida para se criar empregos e colocar a roda da economia a girar de forma positiva.

Não se pode esquecer ainda que o Paraná criou o Fundo de Combate à Pobreza, aprovado pelos deputados, que terá R$ 1,2 bilhão para proteção social nos próximos três anos. O Estado também é um dos poucos, senão o único, a garantir uma política de reajustes salariais definidos por três anos para os servidores e vai antecipar o pagamento do 13º no dia 10 de dezembro.

Para chegar a este momento de equilíbrio das contas, a receita do Paraná é simples: corte de despesas e custos, enxugamento da máquina e austeridade no uso do dinheiro público. Esse conjunto de medidas, junto com realinhamento de alíquotas de impostos estaduais, já gerou um superávit que possibilitou o pagamento de R$ 1,6 bilhão de dívidas com fornecedores e outro R$ 1,3 bilhão será pago até dezembro. Essas medidas também produziram boas notícias aos municípios porque permitiram um aumento de 19,7% nos repasses de ICMS e IPVA às prefeituras. Nos primeiros noves meses, o repasse dos dois impostos foi de R$ 5,93 bilhões – um salto de R$ 1 bilhão se comparar ao mesmo período do ano passado.

Os números desafiam os mais desinformados e mostram que o Paraná, diante da crise que afeta a todos, adotou as medidas necessárias no momento adequado. E está cumprindo com todos os compromissos. Volto a destacar: pagou as promoções e progressões atrasadas, está quitando dívidas, vai garantir o reajuste ao funcionalismo e pagará neste mês a última parcela do reajuste dos professores das universidades estaduais. Em janeiro os servidores, terão pela antecipação da data base o pagamento de toda a inflação de 2015, provavelmente em torno de 9,50%.

Voltemos orçamento. Em 2016, o Estado vai investir 34,17% da receita de impostos em Educação. Isso equivale a R$ 9,3 bilhões – 10% a mais do que em 2015. Dos R$ 400 milhões destinados ao Fundo de Combate à Pobreza – R$ 130 milhões serão para construção de casas populares e R$ 81 milhões para projetos que garantam a defesa da criança e do adolescente. Na Saúde, o investimento será de R$ 3,2 bilhões – o que representa os 12% das receitas, conforme previsto na Constituição. O aporte em infraestrutura de transporte será de R$ 1,5 bilhão para custear 31 obras consideradas prioritárias.

Ao contrário da União, que prevê déficit no Orçamento, com gastos maiores que as receitas, o Paraná vai fechar as contas de 2015 com equilíbrio e vai retomar os investimentos e as obras em 2016.

O Estado esta tendo a coragem de buscar um novo modelo de gestão e alcançar o equilíbrio das contas. A lição de casa foi feita e 2016, repito, será um ano da retomada do crescimento. Já o governo federal deve também fazer a sua parte. A começar pelo pagamento de uma dívida com o Estado, na área de saúde, de mais de R$ 500 milhões. São recursos usados para custear a atenção básica, que garantem o funcionamento da rede hospitalar, o pagamento de prestadores de serviço, e dão o suporte para as redes de urgência e emergência dos municípios paranaenses. A União tem que levantar a suspensão do aval a empréstimos internacionais contratados pelos governos estaduais e prefeituras. O Paraná tem operações já aprovadas pelo BID de US$ 300 milhões em obras infraestrutura e outros R$ 150 milhões para investimentos em municípios paranaenses travados por conta da decisão do governo federal.

Espero que o governo federal tenha a coragem de mudar os rumos da política econômica, deixando de penalizar os entes da federação com o corte de repasses fundamentais ao desenvolvimento e crescimento de estados e municípios, e adote o quanto antes medidas anticíclicas que possam garantir a retomada imediata do crescimento econômico e a continuidade do processo de distribuição de renda para o povo, e não como está acontecendo, transferindo a renda para os mais ricos, por meio dos juros mais altos do planeta, pago aos banqueiros.

*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PMDB e líder do governo na Assembleia Legislativa do Paraná.

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