Artigos

É pra acabar!

“Nada é tão ruim que não possa piorar” – ditado popular

(*) Luiz Claudio Romanelli

Já esperávamos de tudo no samba de uma nota só do ministro da Economia, Paulo Guedes, na Reforma da Previdência, mas ele tirou mais uma maldade da cartola. Além de reduzir o benefício de prestação continuada aos idosos, o BPC, dos atuais R$ 998 para R$ 400 – entre outros pontos divergentes que prejudicam os trabalhadores e os mais pobres -, a nova paulada acaba com o pagamento do abono salarial em estados que desenvolvem a política do piso do salário mínimo regional: Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro.

O abono salarial atende os trabalhadores de baixa renda e funciona como um 14º salário. Hoje, quem tem carteira assinada e recebe até dois salários mínimos (R$ 1,9 mil) por mês tem direito ao abono, cujo valor é de um salário mínimo (R$ 998).

Mas, pela proposta de Guedes, o critério da renda mensal será alterado para um salário mínimo. A medida restringe bastante o grupo de trabalhadores que pode sacar o benefício. Em alguns estados do país, entre eles, o Paraná, vigora um piso mais alto do que o nacional.

De acordo com a Rais (relação anual de informações sociais) de 2017, quase 24 milhões dos 46 milhões de trabalhadores formais do país ganhavam até dois salários mínimos, considerando o patamar nacional.

Se a proposta for aprovada, apenas 2,6 milhões passariam a ter direito ao benefício.

Esse impacto no Paraná será muito grande. Com base nos dados da Rais, 1,5 milhão de trabalhadores paranaenses serão afetados com o fim do abono e e isso representa cerca de R$ 1 bilhão no ano. Para se ter uma ideia, a Caixa Econômica Federal pagou 1.596.839 benefícios do abono salarial em 2018 no Paraná, um montante de R$ 1 bilhão. Isso significa 8,6% de todos os benefícios (Fies, FGTS, seguro desemprego, bolsa família) pagos pela Caixa, 3,9% dos recursos movimentados pelo banco e 2,12% do orçamento do Estado. É muito dinheiro que é muito importante para nossa economia, pois os assalariados não vão gastar esse dinheiro nem em Paris ou Miami e sim no mercado local.

A proposta da reforma da previdência, neste ponto, confronta de forma direta com a política salarial incentivada pelo Paraná nos últimos 13 anos. Vivemos em uma sociedade de consumo. O Brasil é uma sociedade capitalista e moderna e quanto mais poder de compra tem o trabalhador e as pessoas, de uma maneira geral, mais a economia gira.

Pagar salários é a forma mais inteligente de fazer com que a economia de um país se desenvolva. E no Paraná desde 2006, adotamos a política do salário mínimo regional que serve para todas as categorias que não são sindicalizadas. São mais de 700 mil trabalhadores atendidos pelo piso regional.

E ao mesmo tempo serve como uma referência para os acordos de trabalho. E no Paraná, estamos em média 30% superior ao salário mínimo nacional.

A política do piso é um grande sucesso. Tive o privilégio de ter sido o secretário estadual do Trabalho. Nós fizemos o debate tripartite com o setor empresarial, sindical e governamental. Instituir regras da economia no salário é extremamente importante. É uma política estruturante pagar salários condizentes a capacidade de consumo dos trabalhadores.

Todos os brasileiros, independente dos que votaram ou não no presidente Jair Bolsonaro, tinham uma grande expectativa. O país criou essa expectativa que viraríamos a página da história para tocar país para frente. Isso não aconteceu. O ministro Paulo Guedes, nomeado por Bolsonaro para comandar a retomada do crescimento do país, só fala em Reforma da Previdência como salvação da lavoura e diz que vai economizar R$ 1 trilhão em dez anos com sua aprovação.

Agora, economizar esse dinheiro, por exemplo, reduzindo o abono salarial não tem cabimento. Vamos excluir um número enorme de trabalhadores que recebem esses recursos que vira renda, vira consumo. E com problema grave: nos estados como o Paraná que tem piso do salário mínimo regional, os trabalhadores ficarão sem receber o abono. A política econômica tem que ser mais ampla, tem que poder propiciar geração de empregos e das atividades econômicas.

O discurso do Guedes diz que estamos no fundo do poço, vivendo uma crise fiscal – isso todo mundo já sabe. O país sabe que está em uma crise desde 2015. Só que o Bolsonaro foi eleito para resolver os problemas e o Guedes convidado para propor uma política econômica, mas não se vislumbra outra política que não seja a Reforma da Previdência que a gente sabe: não atingirá os mais ricos, atingirá os mais pobres.

A reforma tem que tratar, por exemplo, da cobrança dos R$ 450 bilhões dos devedores com a previdência, e não aborda os R$ 600 bilhões que o governo federal retira anualmente do sistema de seguridade social por meio da DRU para pagar os rentistas.

A PEC número 6/2019 está no site da Câmara dos Deputados e deve ser analisada por todos. Uma leitura rápida se constata que, de fato, a reforma tira dinheiro dos mais pobres. Infelizmente é essa reforma que está sendo debatida em Brasília. A reforma tinha que acabar com os privilégios, infelizmente a está retirando direitos dos mais pobres.

(*) Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual pelo PSB do Paraná

Acordos de leniência ou o crime compensa?

“Os acordos de leniência se revelaram essenciais no combate a malfeitos, mas a falta de transparência mina sua credibilidade. Se o objetivo é mesmo virar a página da corrupção, melhor que empresas e autoridades façam isso às claras” – editorial Folha de S. Paulo.

(*) Luiz Claudio Romanelli

Estamos, novamente, travando uma batalha no Paraná e a sociedade precisa ser alertada – e mobilizada – de mais um provável embuste a ser confirmado se nenhuma medida for tomada a tempo de reverter uma situação que atende mais aos interesses de grupos econômicos do que aos anseios da população paranaense.

Trata-se dos acordos de leniência feitos pelo Ministério Público Federal – MPF, no âmbito da Operação Lava Jato, com as concessionárias do pedágio. Já escrevi sobre este assunto em recente artigo e volto a reafirmar que esses acordos são lesivos aos interesses do Estado, injustos com os paranaenses e atendem, exclusivamente, às concessionárias que estarão livres para participar das licitações da nova leva de concessões no Estado, já que o atual modelo termina em 2021.

Se por um lado os acordos de leniência são importantes, pois preservam as empresas e possibilitam a investigação por meio do instituto da delação – feita pelos executivos e empregados, onde se identifica a suposta participação de agentes públicos e políticos em atos de corrupção que beneficiaram a si próprios, terceiros e no caso a concessionária. Por outro eles levantam uma questão crucial que coloca em xeque sua eficácia: a não realização das obras previstas nos contratos originais das concessões.

Antes que políticos encagaçados e medrosos venham em socorro da operação Lava Jato – como se questioná-los fosse um sacrilégio, deixo claro que não está se discutindo aqui o histórico trabalho de combate à corrupção sistêmica, promovido pelo Ministério Público Federal, especialmente a operação Lava Jato. Questiono, já que o sonho da CCR RodoNorte era fazer o acordo de leniência, que o melhor momento para colocar a “faca no pescoço” dessa gente era justamente agora. Infelizmente, provavelmente por avidez em dar prosseguimento à investigação criminal de punição aos corruptos, o MPF abriu mão de um acordo que fosse mais favorável ao povo paranaense.

O exemplo claro é o acordo feito com a Rodonorte que deve indenizar os usuários das rodovias em R$ 750 milhões – metade convertida em redução de 30% da tarifa por um ano, apesar de recente reajuste, e outros R$ 350 milhões em obras, além de uma multa. Mas o cálculo da corrupção, daquilo que a concessionária causou em prejuízo, segundo especialistas, passa de R$ 2,8 bilhões, ou seja, ficou barato para a CCR/Rodonorte e o acordo passou a sinalizar que o crime compensa.

O que acontece, além disso? O contrato original da concessão com a Rodonorte prevê a integral duplicação da BR-376, entre Ponta Grossa e Apucarana, a Rodovia do Café. Mais de 80 quilômetros dessa duplicação estão excluídos no termo de leniência, porque a concessionária alega que não tem recursos financeiros para executar a obra, embora haja previsão contratual.

Para minha surpresa, ao ler o acordo de leniência, verifiquei que o MPF trata isso no parágrafo 1º do artigo 7º como uma questão a ser discutida judicialmente. O termo diz que o MPF poderá propor ação civil pública com obrigação de fazer contra a Rodonorte.

Reconheçamos, uma ação civil pública não vai dar em nada, até porque a Justiça Federal sempre deu ganho de causa as concessionárias na manutenção do abusivo artigo LXV do Contrato entre o Estado do Paraná e as concessionárias.

Dessa forma, o acordo libera de forma definitiva a Rodonorte a participar de futuras licitações com o poder público, mas o prejuízo ao povo paranaense será permanente. A duplicação da BR-376 dificilmente será viabilizada e esse acordo, ao que consta, repete a máxima do escritor italiano Giuseppe Tomasi di Lampedusa (1896-1957): “Algo precisa mudar para tudo continue como está”!

Um outro ponto que chama atenção e que precisa ser esclarecido é o porquê o Estado do Paraná, na condição de poder concedente, foi excluído do acordo. Nem o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) e a Procuradoria Geral do Estado (PGE) foram chamados a participar da discussão.

Além de não ter sido ouvido, o Estado não assinou, não aceitou e se recusou a anuir o acordo porque entende que é contrário ao interesse público. Os posicionamentos do governador Ratinho Junior, da procuradora-geral do Estado, Letícia Ferreira, e dos procuradores do Estado, foram muito corretas, ou seja, o Estado disse não ao acordo de leniência.

Na Assembleia Legislativa, fiz esta denúncia na tribuna e encaminhei requerimento à Comissão de Obras Públicas que imediatamente se reuniu e deliberou por realizar uma audiência pública em que serão convidados a PGE, a Agência Reguladora do Paraná (Agepar), o MPF, a Rodonorte, para esclarecer os pontos não tratados no acordo de leniência e especialmente, por que a concessionária foi desobrigada de fazer a duplicação da BR-376.

A Rodovia do Café, ao lado da BR-277, que liga Paranaguá a Foz do Iguaçu, é umas das espinhas dorsais do Paraná. Faz a ligação entre Curitiba e o Norte e Noroeste do Estado, é uma estrada importantíssima. Se perdermos esse momento da duplicação, esse trecho entre Ponta Grossa e Apucarana, sabe-se lá quando será duplicado.

Mais do que exigir que a Rodonorte coloque uma placa na estrada admitindo a roubalheira e a corrupção, e o cândido “pedido de desculpas” o acordo de leniência deveria obrigar a concessionária a fazer as obras de duplicação.

Aliás, a duplicação da Rodovia do Café já deveria ter sido feita há muito tempo. Quantas vidas foram ceifadas por conta da omissão da concessionária e de agentes públicos corruptos?

Da forma como está, o acordo dá à Rodonorte uma licença para continuar matando nas rodovias que tem a obrigação de duplicar. O acordo consolida e garante que o crime compensa.

As concessionárias corromperam agentes públicos, causaram prejuízos, sangraram a economia do Estado, participaram de uma licitação viciada – estou denunciando isso há mais de 20 anos – e agora estão desobrigadas a fazer as obras previstas em contrato.

O fato concreto é que o acordo de leniência garante a impunidade da Rodonorte.

Não podemos concordar com esses acordos de leniência e nós vamos ter que aprofundar esse debate, essa discussão. O Estado do Paraná tem que agir com firmeza. A permanecer o acordo de leniência como está significa dizer – vou repetir pela terceira vez – que o roubo compensa. As concessionárias que desviaram bilhões vão voltar a participar de novas concorrências e poderão operar no Paraná, ofendendo a moralidade pública e administrativa. Vão pagar uma pequena parcela do que roubaram e não precisam fazer as obras de duplicação previstas.

É um descalabro histórico.

(*) Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual pelo PSB do Paraná.

Não estou sozinho neste questionamento

Percebi que não estou sozinho neste questionamento:

“Os acordos de leniência se revelaram essenciais no combate a malfeitos, mas a falta de transparência mina sua credibilidade. Se o objetivo é mesmo virar a página da corrupção, melhor que empresas e autoridades façam isso às claras”. – trecho do editorial desta quarta-feira, 8, da Folha de S. Paulo que também questiona os acordos de leniência firmados no âmbito da Operação Lava Jato.

Leia a seguir a sua íntegra:
Foto: CGU / Divulgação

“Lava Jato no escuro

Falta de transparência mina a credibilidade de acordos de leniência

Editorial, Folha de S. Paulo

Empresas atingidas pela Operação Lava Jato deram contribuições decisivas para o esclarecimento dos inúmeros casos de corrupção descobertos nos últimos cinco anos.

As maiores empreiteiras revelaram como se organizaram para fraudar licitações públicas, apontaram políticos e servidores que corromperam e explicaram como o dinheiro sujo chegou até eles.

Acionistas e ex-funcionários dessas empresas também cooperaram, fornecendo informações que os investigadores dificilmente teriam obtido sem sua colaboração.

As empresas não agiram assim por filantropia, mas porque se viram encurraladas pelo avanço da Lava Jato e perceberam que não conseguiriam voltar a fazer negócios com o setor público se não cooperassem com as investigações.

Em troca, obtiveram abatimento nas multas previstas pela legislação e abriram o caminho para voltar a participar de licitações —e se levantar do tombo que levaram após a exposição de seus crimes.
Infelizmente, porém, elas alcançaram esses benefícios em negociações a portas fechadas com as autoridades, conduzidas de forma opaca para a população.

Como esta Folha noticiou, a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) decidiram manter sob sigilo documentos cruciais para o entendimento dos acordos que fecharam com empresas investigadas.

Anexos que detalham os fatos relatados pelas empreiteiras e a maneira como se calcularam suas multas foram preservados assim.

Procedimento similar tem sido adotado pelo Ministério Público Federal, que também negociou acordos de leniência com essas pessoas jurídicas, antes do governo.

Como os procuradores da Lava Jato, a AGU e a CGU dizem que precisam manter o segredo para não prejudicar investigações em curso. Mas muitas informações, como os critérios para o cálculo das multas, nada têm a ver com isso.

O sigilo ajuda a proteger os negociadores de críticas, impedindo a comparação dos benefícios obtidos pelas empresas e das concessões feitas para chegar aos acordos.

Também beneficia as empresas, que esticaram por mais de duas décadas os cronogramas de pagamento de suas multas e vêm tentando preservar até mesmo contratos que confessaram ter obtido de maneira fraudulenta.

Os acordos de leniência se revelaram essenciais no combate a malfeitos, mas a falta de transparência mina sua credibilidade. Se o objetivo é mesmo virar a página da corrupção, melhor que empresas e autoridades façam isso às claras.”

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2019/05/lava-jato-no-escuro.shtml

É preciso estar atento e forte

“Da ditadura eu tenho ódio e nojo” Ulisses Guimarães

O governo do presidente Jair Bolsonaro completa 90 dias neste 1º de abril sem uma única ação concreta em favor do País que seja digna de lembrança e busca disfarçar sua própria inação, incompetência e desmazelo com factoides, ações destrambelhadas e, sobretudo, uma insidiosa guerrilha ideológico-cultural que extravasa pelas redes sociais, em grande prejuízo ao Brasil.

Muito das características deste embate permanente sustentado pelo presidente e seus seguidores foram suas declarações estimulando comemorações pelo aniversário do golpe de 31 de março de 1964.

Não adianta fantasiar, comemorar ou rememorar é a mesma coisa. O golpe de 1964 pode ser chamado do que quiserem: de “golpe militar”, “de revolução”, “a redentora”, etc.

É um fato histórico e nenhuma nova narrativa vai modificar isso. O que causa espécie é que em pleno Estado Democrático de Direito, se proponha atos nos quartéis que atentem contra a verdade. O fato em si é tão grave que uma simples ordem de serviço emitida pelo presidente da república para ser lido nos quartéis questionando a história assustou a todos que acreditam na democracia.

Não é isso que o Brasil precisa e não é isso que vai resolver uma questão crucial neste momento: criar postos de trabalho para mais de 13 milhões de brasileiros desempregados. O povo quer paz, trabalho e políticas públicas consistentes para educação, saúde, segurança, habitação e transporte público. Quer a retomada do crescimento, geração de emprego e renda. Votou em Bolsonaro na expectativa de que, eleito, cumprisse seus compromissos.

E o que faz o presidente da República? Acena com fantasmas do passado, com um discurso que seria mais adequado aos tempos da guerra fria. É uma tentativa de rasgar a história e impor ao limbo as lutas que vencemos e perdemos na retomada democrática do país, nas quais, eu e muitos brasileiros têm orgulho de ter participado ativamente deste processo que nos custou tantas vidas.

O presidente parece indiferente à qualquer senso crítico que o cargo exige. Em Washington, no lamentável espetáculo de subserviência em que prestou vassalagem a Donald Trump, Bolsonaro atirou contra o “velho comunismo”, que já não existe mais nem na China, exceto na retórica oficial de Pequim.

Depois do encontro que lá teve com seu guru Olavo de Carvalho, saiu em defesa das comemorações do 31 de março nos quartéis, provavelmente sob a influência do astrólogo-filósofo da Virgínia, mentor intelectual do bolsonarismo.

É mais que hora de tratar o regime militar (1964-1985) como página virada, um momento difícil na história nacional, pois centenas de pessoas foram mortas (de ambos os lados), torturadas, exiladas. As mazelas são bem conhecidas e jamais deverão ser esquecidas, mas faz parte do passado.

Felizmente, a postura presidencial mais constrangeu que excitou oficiais do Exército, da Marinha e da Aeronáutica: parcelas amplamente majoritárias da oficialidade se modernizaram e se profissionalizaram. A ‘comemoração’ do presidente constrangeu os militares da nova geração. Eles têm formação técnica, são humanistas, amam a pátria e acima de tudo, amam a democracia.

Os militares têm consciência das atribuições constitucionais das Forças Armadas na democracia, de defesa da pátria e garantia dos poderes constituídos. De seu papel central no desenvolvimento nacional e na manutenção da nossa soberania. Subordinadas ao poder civil.

A insensata intervenção do presidente, típica das antigas vivandeiras de quartéis – na inesquecível definição do marechal-presidente Castelo Branco, referindo-se aos civis que insuflavam as ambições militares -, só não teve maior repercussão porque, em paralelo, ele se meteu num inacreditável bate-boca com o presidente da Câmara dos Deputados sobre as responsabilidades de cada um deles na votação da reforma da Previdência.

Além disso, o próprio Bolsonaro recuou depois, ao trocar o verbo: não queria comemorar, mas “rememorar” o golpe de 64 – uma emenda que não melhorou o soneto.

O comportamento errático do presidente, sua constante conduta em zigue-zague, ameaça por em risco até mesmo a única iniciativa palpável de seu governo, a reforma da Previdência enviada ao Congresso, ainda que o projeto seja suscetível de muitos questionamentos por retirar direitos dos segmentos mais vulneráveis da população.

Mais governo e menos tuítes, mais seriedade e menos negligência. É o mínimo que o País espera do presidente. Basta de instabilidade e turbulência.

É hora de começar a governar, presidente.

*Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual pelo PSB.

A gestão do futuro

A recente apresentação do projeto de lei de Eficiência na Gestão do Estado na Assembléia Legislativa é um marco para a administração pública do Paraná. Governo e parlamento vão discutir juntos o futuro do Estado, de forma planejada, séria e estratégica, para os próximos vinte anos.

É um projeto consistente, com diretrizes e ferramentas de gestão para um planejamento de longo prazo, bem como as metas ousadas para o desenvolvimento econômico e social do Paraná. Conforme afirmou o governador Ratinho Junior “eficiência será lei no Paraná”.

Isso porque o plano estabelece os princípios e normas de gestão administrativa e de finanças públicas do Estado, aponta mecanismos prudenciais de avaliação de controle das ações e políticas do governo e também determina medidas para se alcançar e manter o equilíbrio das contas públicas e o alinhamento do Plano Plurianual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei Orçamentária Anual, com metas estabelecidas no planejamento de longo prazo do Estado.

Estudo apresentado pelo economista Paulo Rabello de Castro, ex- presidente do IBGE e do BNDES, mostram que o Paraná pode receber um programa de investimentos que soma R$ 40 bilhões no período de cinco anos. Com isso, o Governo do Estado projeta um crescimento anual da economia na faixa de 4% e a geração de 500 mil novos postos de trabalho até 2023.

Do total de investimentos, R$ 26 bilhões virão do tesouro estadual. O restante deverá ser captado por meio de parcerias público-privadas (PPPs). O tema deve ser visto com otimismo e confiança. Nosso Estado tem totais condições para atrair investimentos e parcerias, pois ao contrário da maioria, o Paraná não está quebrado. Está equilibrado e terá uma lei de eficiência com metas superiores às da Lei de Responsabilidade Fiscal.

O Paraná e o Pará são os estados que mais pontuam em termos de equilíbrio financeiro e fiscal em todos os aspectos. Segundo Rabello de Castro, essa condição, acrescida da aprovação da lei da eficiência, vai ajudar a ampliar ainda mais os investimentos no Estado.

Esse conjunto representa uma visão de futuro, muito além das demandas diárias. O fundamental é que garante que o recurso público, dinheiro do contribuinte paranaense, será aplicado com equilíbrio, eficiência, gerando resultados com benefícios diretos para a população do Paraná, principalmente a médio e longo prazo.

Nós vivemos em um mundo de permanente evolução. O nosso país está atrasado, nós sabemos disso. Nós, aqui no Paraná, estamos mudando o modelo de gestão e creio que as propostas de inovações trazidas pelo governador Ratinho Junior não são apenas na base tecnológica ou na transformação da economia, mas no poder de gestão do Estado, na busca da eficiência.

Tudo isso com um austero programa de integridade, de conformidade, que cria de fato uma melhor segurança em termos da gestão do dinheiro público e da execução de políticas públicas. É também uma inovação para melhorar a gestão e aproximar mais a população dos serviços, das decisões de governo, com total desburocratização dos processos de governo e redução de gastos.

O papel da Assembleia Legislativa é fundamental nesta proposta. Estamos discutindo o futuro do Paraná e a maneira com que o Governo do Estado atenderá as necessidades e os anseios da população no futuro. É uma discussão que está acima de eventuais divergências políticas pontuais. Por isso o papel dos deputados também precisa ser visionário, inovador e, acima de tudo, do mais puro paranismo.

Daqui a vinte anos, poderemos projetar os próximos vinte anos, mas com a certeza que tomamos o caminho certo. Poderemos nos orgulhar de ter feito parte das mudanças que se iniciaram com o programa de ajuste fiscal em 2015 e que garantiram o futuro do nosso Estado.

*Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual pelo PSB.

Quem vai pagar o pacto?

“Não vamos desistir do Brasil. É aqui onde nós vamos criar nossos filhos, é aqui onde nós temos que criar uma sociedade mais justa” – Eduardo Campos.

Luiz Claudio Romanelli*

O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou na semana que passou que enviaria ao Congresso Nacional a proposta do novo pacto federativo. Enquanto a Reforma da Previdência, disse ele, ganhasse a Câmara dos Deputados, o pacto federativo seguiria seu curso no Senado. Com a reforma, tudo bem, foi entregue, mas o ministro recuou em relação ao novo pacto. Agora ficará para um segundo momento, talvez em abril, adiantou a equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro.

O principal argumento para adiantar a PEC do Pacto é a quebradeira generalizada – o Paraná é uma exceção – de estados e municípios. Para salvar o caixa de governos e prefeituras, Guedes condicionou a antecipação de receitas pela União a ajustes e reformas previstos na proposta – um “balão de oxigênio”.

Agora, vale a mesma pergunta que cabe para a reforma da previdência: quem vai pagar essa conta? E além dos ajustes que maior parte de governos estaduais e prefeituras já fazem – corte de gastos e despesas -, o que prefeitos e governadores podem mais fazer? Temo pela precarização ainda maior dos serviços públicos com a transferência total para iniciativa privada de empresas estratégicas para estados e municípios.

Em outro ponto, o ministro afirmou que é preciso desamarrar, desindexar, desvincular os orçamentos e devolver o poder de decisão para prefeitos e governadores fazer o que é mais urgente no município e estado. As vinculações orçamentárias e gastos obrigatórios – exemplos: 25% das receitas em educação, 12% e 15% em saúde – estão previstos em lei e que qualquer mudança merece atenção redobrada da sociedade.

Essa proposta, a princípio, pode agradar prefeitos e governadores. Os prefeitos apontam para enormes dificuldades de governar hoje os municípios. Muitas das obrigações que estão no colo dos prefeitos não são, a rigor, obrigações das administrações municipais. Se não existir um novo pacto muitos municípios brasileiro, afirma a Frente Nacional dos Prefeitos, vão entrar em insolvência num prazo de três a quatro anos. E vários municípios já estão nesta situação agora. A Confederação Nacional dos Municípios aponta que 67% das prefeituras atrasam o pagamento aos fornecedores.

Eu sempre defendi a urgência de um novo pacto federativo que, em resumo, deve tratar da partilha justa da arrecadação dos impostos entre os entes federados: União, estados e municípios. É um debate que se arrasta há 15 anos, mas que não se resolve apenas com ajustes, desvinculação orçamentária e sem resolver, principalmente, a repartição deste bolo de receitas.

Como está hoje essa divisão – algo em torno de 55% para União, 25% com os estados e 20% com os municípios – não pode ficar. Os prefeitos defendem – e eu concordo com a proposta – a divisão da seguinte forma: 40% para a União, 30% para estados e 30% para municípios. Esse é o principal ponto que deve nortear a construção do novo pacto federativo. Os outros pontos, como os já sinalizados pelo ministro Guedes, merecem a nossa preocupação.

Na atual conjuntura, as prefeituras têm as despesas aumentadas na prestação dos serviços essenciais, como saúde e educação. Além de prover as cidades de hospitais, postos de saúde e creches, são necessários recursos para manutenção e a contratação de médicos, enfermeiros e professores. A contrapartida do governo federal é pífia e as obrigações recaem todas nas costas dos prefeitos.

Hoje, ex-prefeitos afirmam não querem se candidatar novamente aos cargos pois conhecem as dificuldades financeiras para se gerir uma administração pública. O governo federal faz a obra, mas o ônus do funcionamento fica com a prefeitura que não recebe a contrapartida para manter as estruturas e os serviços com qualidade. Um grande programa como da Saúde da Família, por exemplo, acaba tendo um custo muito maior do que é repassado pela União.

O novo pacto federativo deve ensejar a recuperação da capacidade de investimentos dos estados e municípios. Não é possível recuperar o Brasil, como diz pretender o ministro Guedes, se não houver repactuação que envolva o disciplinamento das atribuições e responsabilidades dos entes federativos e a repartição dos investimentos.

Em tempo: O Brasil tem mais de 4,7 mil obras paralisadas na maioria dos municípios que podem agregar R$ 115 bilhões à economia e gerar mais de um milhão de empregos. Um plano emergencial para retomá-las vem em boa hora ministro.

Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual pelo PSB.

Fraternidade e políticas públicas

Luiz Cláudio Romanelli

“Serás libertado pelo direito e pela justiça” – (Is 1,27)

Vivemos em tempos difíceis e a campanha da fraternidade da igreja católica desta quaresma pode nos levar a um debate amplo sobre as conquistas sociais que demandaram muita luta e que hoje parecem comprometidas por uma conjuntura política-econômica adversa que não as consideram, nesta quadra da vida, como algo que precisa ser preservado para bem estar da sociedade brasileira.

Vem em boa hora porque destaca a importância das políticas públicas na garantia de serviços públicos de qualidade prestados à população e evidencia a participação popular como principal mecanismo para torná-las sólidas e perenes. O tema da campanha é emblemático: “Fraternidade e Políticas Públicas e o lema “Serás libertado pelo direito e pela justiça – (Is 1,27)”.

Em suma, a campanha da fraternidade vai discutir as políticas públicas com duas finalidades: assegurar o bem comum e defender a vida digna das pessoas.

É uma temática muito propícia para os legislativos, estaduais e municipais, fazer este debate pela legitimidade do voto consagrado nas urnas. É oportuna porque debatemos no Congresso Nacional as reformas que estão por vir – entre elas, a da previdência – e que podem penalizar os mais pobres e os trabalhadores. Útil e necessário, sobretudo, neste momento em que o cenário político nacional é permeado por denúncias, casos de corrupção e situações de injustiça que privam as pessoas de participação nos bens da sociedade.

É uma campanha que vai reforçar aquilo que já sabemos, mas que é sempre bom repetir: o enfrentamento de problemas estruturais das cidades em áreas como a saúde, habitação e segurança e a atenção aos que mais precisam do poder público, só pode ser bem encaminhado com políticas públicas formuladas no espelho da sociedade e com a participação de todos os envolvidos neste processo.

Sabemos, de antemão, que são os mais pobres que sofrem as consequências de políticas excludentes e que somente a informação, a participação e a solidariedades são meios de combater este tipo de retrocesso. A este respeito, o professor Cezar Bueno de Lima nos diz que “se a única possibilidade de uma criança pobre ascender é a escola e a escola falha, o resultado é a tragédia humana”.

A participação popular na formulação de políticas públicas pode se dar de várias formas que até se tornaram comum nos últimos anos, mas que ainda são importantes e que precisam ser ampliadas: audiências públicas, conselhos, conferências, fóruns e reuniões. A participação pode se dar através das organizações da sociedade civil, dos movimentos sociais e pode começar nas associações de bairro, nos clubes de mães, nos grêmios estudantis, centros acadêmicos, sindicatos, entre outras entidades.

No Paraná e no País, temos vários exemplos de políticas públicas que perpassam governos pela importância e alcance social que a caracterizam. Leite das Crianças, Mãe Paranaense, Minha Casa, Minha Vida e Bolsa Família são programas baseados em políticas públicas traçadas no Estado e no governo federal. Eu, pessoalmente, coordenei a política habitacional e a política de transferência através do do programa Compra Direta. Foram experiências exitosas que me marcaram profundamente pelos resultados alcançados e que motivaram a seguir na vida pública.

O texto-base da campanha traz alguns pontos que destaco. Ele diz que participar das discussões e execução das políticas públicas é ajudar a construir a fraternidade e a resgatar a dignidade das pessoas, principalmente, dos mais necessitados. A verdadeira política, diz o texto, é o cuidado para com o que é comum e o esforço de realizar ações que ajudem na integração de todos na sociedade. E nas palavras do Papa Francisco, “a política é uma das formas mais preciosas da caridade, porque busca o bem comum”.

Luiz Claudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, é deputado estadual pelo PSB.

Foto: Sandro Nascimento/Alep e Dálie Felberg/Alep

Campanha da fraternidade vem em boa hora, diz Romanelli

O deputado Romanelli (PSB) disse nesta quarta-feira, 6, que a Campanha da Fraternidade lançada pela Igreja Católica “vem em boa hora” porque amplia o debate e a importância da “formulação de políticas públicas” na garantia de serviços públicos de qualidade à população. O tema da campanha é “Fraternidade e Políticas Públicas e o lema e o lema “Serás libertado pelo direito e pela justiça – (Is 1,27)”

O texto-base da campanha explica etapas para elaboração de novas leis e cita os canais de participação social que são garantidos na Constituição. “São projetos de lei produzidos pela iniciativa popular. Temos que estimular a população a participar de forma efetiva na elaboração de políticas públicas”, disse Romanelli.

“Há várias formas e mecanismos que devem ser usados para ampliar a participação popular: audiências públicas, conselhos, conferências, fóruns e reuniões, além das organizações da sociedade civil e movimentos sociais. A participação pode começar na associações de bairro, nos clubes de mães, nos grêmios estudantis, entre outras entidades”, completa.

Romanelli cumprimentou a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) pelo tema oportuno e que amplia o debate sobre as reformas que estão por vir, previdência e trabalhista, e que podem penalizar os mais pobres e os trabalhadores. “Parabéns CNBB, Igreja Católica, pelo tema da Campanha da Fraternidade. Útil e necessário, sobretudo, neste momento em que o país está passando. Sabemos que são os mais pobres que sofrem as consequências de políticas públicas mal formuladas e excludentes. A informação, a participação e a solidariedades são duas das principais soluções para combatermos o retrocesso”, disse.

Reforma feita por ricos para pobres é um perigo

O presidente Jair Bolsonaro entregou na quarta-feira, 20, ao Congresso Nacional a proposta da Reforma da Previdência, uma reforma há tempos esperada e apontada pelo governo e por especialistas como alternativa mais eficaz para superar a crise fiscal que atinge boa parte dos municípios, estados e a própria União e ainda essencial para garantir a sustentabilidade das contas públicas.

A reforma da previdência – assim como as reformas tributária e política e o novo pacto federativo -, diga-se de passagem, é necessária. O que deve se discutir e que tem pontuar os debates no Congresso, nos legislativos estaduais e municipais e na sociedade é o impacto que a “Nova Previdência”, como dita pelo governo, vai causar nos trabalhadores rurais e urbanos e sobre um segmento social expressivo que ainda precisa de políticas compensatórias e de transferência de renda.

A reforma não pode penalizar os mais humildes e os mais pobres que podem ficar à míngua, sem apoio do Estado, aumentando de forma célere o número de miseráveis no País.

Em síntese, a proposta da reforma da previdência fixa idades mínimas para se aposentar: mulheres (62 anos) e homens (65 anos). A contribuição mínima será por 20 anos – hoje o tempo mínimo é de 15 anos – e para ter direito a 100% do benefício, será preciso contribuir por 40 anos. Conforme propõe o ministro da Economia, Paulo Guedes, não haverá mais a aposentadoria por tempo de contribuição. A modalidade hoje permite se aposentar com tempo mínimo de 30 anos de contribuição para mulheres e 35 anos para homens, sem uma idade mínima.

Resultado de imagem para reforma da previdenciaA equipe econômica argumenta que a nova reforma vai estancar o rombo provocado pelo pagamento dos benefícios do INSS e do regime próprio dos servidores públicos e dos militares. Essa conta fechou negativo em R$ 290,3 bilhões em 2018. Por outro lado, segundo ainda o governo, vai garantir uma economia de R$ 1,164 trilhão em 10 anos, sobrando mais dinheiro para investir em áreas prioritárias como saúde e segurança.

Como se constata, é de longe o tema mais complexo da agenda definida pelo governo Bolsonaro neste ano e muito preocupante, principalmente em relação ao trabalhador. Volto a repetir, a reforma é necessária, mas gente com cabeça de rico pensando em reforma para pobre é um perigo grande.

Todos sabemos que já passou da hora do país acabar com os privilégios de todos os tipos, mas não se pode fazer com um trabalhador braçal ter tempo de serviço de 40 anos para ter o direito de se aposentar ou uma aposentadoria aos 65 anos. Para os trabalhadores rurais, a idade mínima de aposentadoria proposta é de 60 anos para homens e mulheres, e contribuição mínima será de 20 anos.

Temos que ter uma idade mínima para aposentadoria – a população está envelhecendo e tem hoje maior expectativa de vida – e 60/61 anos para os homens e 57 anos para as mulheres são idades mínimas razoáveis. Sempre é bom atentar que há categorias profissionais que têm situações diferenciadas e as idades mínimas devem ser também diferenciadas.

Esse é um debate que tem ser feito sem power point. Acabar com os privilégios é uma coisa, mas a proposta está impactando 83,4% dos trabalhadores que ganham até dois salários mínimos e tira o benefício de prestação continuada dos idosos de um salário mínimo (R$ 998) para R$ 400. Os trabalhadores rurais terão que trabalhar cinco anos mais com uma carência cinco anos maior, fazendo quatro jornadas de trabalho no campo.

Há ainda outros pontos divergentes que merecem um bom debate como, por exemplo, se realmente é necessário desconstitucionalizar a seguridade social, possibilitando sua alteração por lei complementar, que exige 257 votos de deputados contra 308 nas emendas constitucionais.

Acabar com os privilégios é uma coisa, mas a proposta está impactando 83,4% dos trabalhadores que ganham até dois salários mínimos e tira o benefício de prestação continuada dos idosos de um salário mínimo (R$ 998) para R$ 400.

O Congresso Nacional não deve ter a pressa do governo e do mercado para aprovar a reforma que, segundo o consultor legislativo Luiz Alberto dos Santos, comprime e reduz a despesa pública com a previdência e assistência social, “ainda que isso implique na transferência de renda dos assalariados, aposentados, pensionistas e pessoas com deficiência e idosos carentes para o pagamento de despesas da dívida pública, ou mesmo para o setor financeiro, em vista das propostas de “privatização” do seguro social nela contidas”.

Agora creio que o presidente Jair Bolsonaro podia explicar porque mudou de opinião sobre a idade mínima de aposentadoria e também pedir para o autêntico Senhor de engenho, Paulo Guedes, explicar porque a reforma não trata da cobrança dos R$ 450 bilhões dos devedores com a previdência, e não aborda os R$ 600 bilhões que o governo federal retira anualmente do sistema de seguridade social por meio da DRU para pagar os rentistas.

Por ultimo podia explicar porque continuam concedendo isenções de R$ 40 bilhões por ano para as petroleiras e incentivos e benefícios fiscais que reduzem anualmente em R$ 376 bilhões a receita da União em 2019. Arre cáspita!

PS. Para quem tem curiosidade de saber, seguem os 500 maiores devedores da previdência (clique aqui).

*Luiz Claudio Romanelli, advogado, especialista em gestão urbano, deputado estadual pelo PSB na Assembleia Legislativa do Paraná.

Damares, a goiabeira e a violência contra as mulheres

Damares Alves, indicada para comandar o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos da gestão Bolsonaro, foi ridicularizada pela mídia e nas redes sociais por ter afirmado que viu Jesus em cima de uma goiabeira. Segundo a pastora evangélica, que costuma relatar o ocorrido em suas pregações, o episódio teria acontecido quando ela tinha dez anos e estava decidida a suicidar-se tomando veneno, desesperada devido aos abusos sexuais de que era vítima, desde os seis anos. Ora toda criança tem um amigo “imaginário” na infância, feliz dela que esse amigo era Jesus.

A repercussão foi imediata, com a futura ministra alvo de todo tipo de chacotas. Creio que a mídia perdeu a oportunidade de abordar o que efetivamente importa na fala de Damares:

O fato de que há milhares de meninas em cima de goiabeiras, sofrendo em silêncio e à espera de alguém que as liberte. Há também milhares de mulheres em relacionamentos abusivos ou vítimas de abusos sexuais que sofrem caladas porque seu agressor ocupa posição e ascendência na sociedade, como nos mostra o recente escândalo envolvendo o médium João de Deus.

Romper a cortina de silêncio que cerca esses casos de violência contra meninas e mulheres é mais importante que as especulações sobre se o filho de Deus apareceu no quintal de Damares.

As crianças são as maiores vítimas de estupro no Brasil, segundo o Atlas da Violência de 2018. O estudo, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), aponta que 50,9% dos casos registrados de estupro em 2016 foram cometidos contra menores de 13 anos de idade. Além disso, em 32,1% dos casos, as vítimas foram adultos, e em 17%, adolescentes.

Se somarmos, 68% das vítimas têm menos de 18 anos de idade.

O estudo também aponta uma alta taxa de recorrência nos casos de estupro. Em 2016, 42,4% das vítimas disseram não ser a primeira vez que sofriam com violência sexual. Nesses casos, a maioria dos autores dos crimes era conhecido das vítimas, isso porque um dos principais espaços de violência contra a mulher não é a rua, e sim dentro das casas das próprias vítimas. No total, o Atlas da Violência mapeou mais de 13 mil casos registrados como ocorridos dentro da casa da pessoa violentada

O ambiente prevalece especialmente nos casos de estupro cometidos por pessoas conhecidas da vítima. Nessa situação, a casa é a cena do crime em 78,6% dos casos.

Mas acredito que a futura ministra precisa rever alguns de seus conceitos sobre a visão de mundo, de gênero, da posição da mulher no mercado de trabalho e na sociedade.

Agora a ministra indicada, pastora da Igreja Quadrangular, fez afirmações que caberiam num púlpito ou numa discussão, mas não como gestora pública.

Ideia tais como meninas devem ser tratadas como “princesas”, e meninos como “príncipes”, Infelizmente, gravidez é um “problema” que dura só nove meses… e que “o aborto dura uma vida inteira da mulher”.

Outras pérolas: “… gostaria de estar em casa toda tarde, numa rede, e meu marido ralando, muito, muito, para me sustentar e me encher de joias e presentes. Esse seria o padrão ideal da sociedade”. Não dá para falar isso, num país que 52% dos domicílios são chefiados por mulheres.

Eu acredito que a prevenção para a violência sexual contra meninas e contra o aborto começa na escola, com aulas de educação sexual.

Infelizmente, o tema foi completamente descaracterizado e deturpado pela chamada “ideologia de gênero” e com isso tenta se impedir o debate e a discussão nas escolas sobre as questões de gênero.

Eu defendo que as crianças precisam ser educadas desde a infância, na família e na escola, sobre a igualdade entre meninos e meninas, homens e mulheres. E na idade adequada, devem receber informações e orientações sobre sexo, sexualidade, métodos contraceptivos porque está mais do que comprovado que a educação sexual é a melhor prevenção para o aborto entre adolescentes e jovens mulheres.

Muito já se escreveu sobre o perigo de educar meninos como príncipes e meninas como princesas- e o risco de criar pequenos imperadores ditadores. Crianças devem ser educadas como crianças, com liberdade e para que tenham oportunidades de desenvolvimento de suas habilidades e capacidades. Infelizmente, há milhões de crianças que não frequentam a escola, não têm acesso à educação infantil e que trabalham desde muito cedo. Essa deveria ser a preocupação da futura ministra assegurar a universalização da educação infantil e combater o trabalho infantil.

Damares parece viver num universo paralelo quando fala sobre o papel da mulher na sociedade e num mundo “ideal” em que cabe ao homem o papel de provedor exclusivo da família. No mundo real, há milhões de mulheres chefes de família, que sustentam seus filhos sem apoio e enfrentam um mercado de trabalho desigual, recebendo menos que seus colegas homens que exercem a mesma função.

A ministra Damares precisa, portanto, rever alguns de seus conceitos, até porque na realidade somos uma democracia plural e moderna.

A visão de Jesus na goiabeira foi uma benção, agora o que preocupa é o pensamento retrógrado da futura ministra em relação a assuntos tão importantes como o aborto, a educação infantil e as mulheres.

Scroll to top